A violência tem tomado proporções inaceitáveis, todos os dias surgem novos crimes em destaque nos meios de comunicação, invariavelmente piores do que os tidos até ontem como intoleráveis ou absurdos, experimenta-se um curto período de sobressalto, até que o assunto cai novamente no esquecimento.
A sociedade, em grande medida embrutecida, se acostumou a encarar a criminalidade com uma mistura de frieza e medo resignado. As autoridades também tem mostrado uma impassibilidade inaceitável diante da escala da violência.
Existe a necessidade de discutir a reestruturação das corporações policiais e o próprio conceito de segurança pública.
Não há solução simples para o problema, o que não impede que grande esforço seja feito para minimizar seus efeitos. É preciso acordar para o fato de que à sua volta, em imensa maioria, vive-se mal, morre-se muito por muito pouco.
" Cultura de paz
ResponderExcluirA mobilização em prol da paz, no Brasil, nasceu
do aumento da violência, principalmente quando a
criminalidade passou a vitimar as classes privilegiadas
dos centros urbanos. A paz que os brasileiros buscam
está diretamente vinculada à redução de crimes e
homicídios. Refletir sobre a construção da cultura de
paz passa, portanto, pela análise de como a sociedade
compreende e pretende enfrentar o fenômeno da
violência. Esse tem sido o tema de inúmeros debates.
É possível agrupar, grosso modo, três paradigmas que,
implícita ou explicitamente, estão presentes nessas
discussões — o da repressão, o estrutural e o da
cultura de paz.
O modelo baseado na repressão preconiza, como
solução para a violência, medidas de força, tais como
policiamento, presídios e leis mais duras. Essas
propostas sofrem de um grave problema — destinamse
a remediar o mal, depois de ocorrido. Também
falham em não reconhecer as injustiças
socioeconômicas do país. Apesar disto, esse é o
modelo mais popular, pois, aparentemente, dá
resultados rápidos e contribui para uma sensação
abstrata (mas fundamental) de segurança e de que os
crimes serão punidos.(...)
O segundo paradigma afirma que a causa da
violência reside na estrutura social e no modelo
econômico. Conseqüentemente, se a exclusão e as
injustiças não forem sanadas, não há muito que se
fazer. Apesar de bem-intencionado, ao propor uma
sociedade mais justa, esse modelo vincula a solução
de um problema que afeta as pessoas de forma
imediata e concreta — violência — a questões
complexas que se situam fora da possibilidade de
intervenção dos indivíduos — desemprego, miséria,
etc. —, gerando, desse modo, sentimentos de
impotência e imobilismo.
Uma compreensão distorcida desse modelo tem
levado muitos a imaginar uma associação mecânica
entre pobreza e violência. (...)
É importante evidenciar a violência estrutural, pois
ela encontra-se incorporada ao cotidiano da sociedade,
tendo assumido a aparência de algo normal ou
imutável. Mas a paz não será conquistada apenas por
mudanças nos sistemas econômico, político e jurídico.
Há que se transformar o coração do homem.
O terceiro é o paradigma da cultura de paz, que
propõe mudanças de consciência e comportamento
— inspiradas em valores universais como justiça,
diversidade, respeito e solidariedade — tanto de parte
de indivíduos como de grupos, instituições e governos.
Os defensores dessa perspectiva compreendem que
promover transformações nos níveis macro e micro
não são processos excludentes, e sim
complementares. Buscam trabalhar em prol de
mudanças, tanto estruturais quanto de atitudes e estilos
de vida. Também enfatizam a necessidade e a
viabilidade de reduzir os níveis de violência através de
intervenções integradas e multiestratégicas,
fundamentadas na educação, na saúde, na ética, na
participação cidadã e na melhoria da qualidade de vida.
O primeiro passo rumo à conquista de paz e nãoviolência
no Brasil é uma mudança paradigmática: o
modelo da cultura de paz deve tornar-se o foco
prioritário das discussões, decisões e ações. Só será
possível colher os frutos da paz quando semearmos
os valores e comportamentos da cultura de paz. Isso
é a tarefa de cada um de nós, começando pelas
pequenas coisas, e no cotidiano, sem esperar pelos
outros. Gradualmente, outros serão sensibilizados e
decidirão fazer a sua parte também."
MILANI, Feizi M. Jornal do Brasil, 02 jan. 2002.