segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Zaratustra – Nietzsche – Prólogo – Capítulo IX

Texto na Integra:
IX
Por muito tempo esteve adormecido Zaratustra, e os raios da aurora bem como os da manhã giraram-lhe sobre a face. Por fim seus olhos se abriram, e Zaratustra maravilhou-se com a floresta, com o silêncio, e maravilhou-se com também consigo mesmo. Depois ergueu-se de um lance como um marinheiro que de súbito vê terra, e exultou: pois via agora uma verdade nova. E então falou consigo mesmo:
“Fez-se uma luz em mim: preciso de companheiros, companheiros vivos – não de companheiros mortos ou cadáveres, que eu leve comigo aonde eu for.
“Não, quero companheiros vivos, que me sigam para onde eu for, porque querem seguir a si mesmos.
"Fez-se uma luz em mim: Zaratustra não deve mais falar à multidão, mas a seus companheiros! Zaratustra não se deve tornar pastor nem o cão do rebanho!
“Seduzir e afastar muitos do rebanho – eis a meta a que vim. Multidão e rebanho, que tudo atroe contra mim: Zaratustra quer que os pastores o chamem de bandido.
“Emprego a palavra pastores, mas eles próprios se designam com os bons e os justos. Emprego a palavra pastores, mas eles próprios se de designam como fiéis da fé verdadeira.
“Olhai, esses bons e esses justos! Que mais odeiam? Aquele que destrói suas tábuas de valores, o demolidor, o criminoso – mas este é que é um criador.
“O criador procura companheiros para si e não cadáveres, e bem assim nem rebanhos e nem crentes. O criador procura companheiros de criação, para que inscrevam novos valores sobre novas tábuas.
“O criador procura companheiros, companheiros de colheita: porque nele tudo está amadurecido para a ceifa. Mas faltam-lhe as cem foices: por isso que, na sua cólera, sai arrancando espigas.
“Os companheiros que o criador procura são os que sabem afiar as foices. Serão chamados de destruidores e desdenhosos do Bem e do Mal. Mas na verdade são os ceifadores, aqueles que celebram a festa.
“Companheiros de criação é o que busca Zaratustra, companheiros de ceifa e de festa procura Zaratustra: nada tem a ver com rebanhos, pastores e cadáveres.
“E tu, meu primeiro comparsa, repousa em paz! Estás bem sepulto nesse oco de árvore, posto a salvo dos lobos.
“Mas devo deixar-te, já se foi o tempo. Entre uma aurora e outra, uma nova verdade despontou em mim.
“Não devo ser nem pastor nem coveiro. Não quero nunca mais falar às multidões, pela ultima vez falei a um morto.
“O criador, o ceifeiro, o que celebra a festa, a estes quero unir-se: a eles quero revelar o arco-íris e todos os graus do super-homem.
“Aos solitários vou erguer meu conto e mesmo aos casais que vivem em solidão. Quem ainda tiver ouvidos para o inaudito, a esse quero inundar o coração com a minha felicidade.
“Quero atingir a minha meta, seguir o meu caminho; saltarei por cima dos hesitantes e dos descuidados. E que meu passo seja o seu declínio!”

Comentários:
Infelizmente Zaratustra percebeu a incapacidade do homem em compreender o super-homem. Apesar de compreender a causa do fracasso, achou um remédio: fugir das multidões.
Novamente Nietzsche traz a alusão dos discípulos de Cristo para criticá-lo novamente, em vez de companheiros que o sigam, estes devem seguir a si mesmo. Criar a si mesmo é criar ou recriar eles próprios, lembram do processo criativo do super-homem?
Seguir a si mesmo é, pois, exatamente não mais seguir a Deus, renunciar ás tábuas da lei, diretamente gravadas por Deus, desobedecer a Deus para obedecer somente a si mesmo.
Ainda hoje percebe-se a incapacidade do homem em compreender Nietzsche, vejo alguns colegas falarem que o nazismo de Hitler baseou-se nas idéias nazistas dele. Ora, quem acompanha os textos deste o início pode verificar que Nietzsche não discrimina ninguém em seus textos, ele apenas utiliza personagens e metáforas para defender sua tese, todos podemos compreender o super-homem, não existe raça superior. O super-homem é todo homem que esquece sua moral religiosa e passa a viver e a compreender o mundo a sua maneira, criando valores e transformando sua realidade e o mundo a sua volta.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Zaratustra – Nietzsche – Prólogo – Capítulo VIII

Texto na Integra:
VIII
Após ter falado assim consigo, Zaratustra colocou o cadáver às costas e se pôs a caminho. Mal dera cem passos, surgiu um homem que lhe veio falar junto ao ouvido. E – vejam só! – quem lhe falava assim era o bufão da torre. “Vai-te embora daqui, ó Zaratustra”, disse-lhe, “há gente demais aqui que te odeia. Odeiam-te os bons e os justos, chamam-te inimigo e julgam que os desprezas; os fieis da verdadeira fé também te odeiam, consideram-te um perigo para o povo. Tua sorte foi terem rido de ti; e na verdade falaste como um bufão. Tua sorte foi teres te acumpliciado com esse cão morto; ao te rebaixares assim, te salvaste por hoje. Mas parte da cidade – senão amanhã saltarei sobre ti, eu que estarei vivo, sobre ti que estarás morto.” Com estas palavras, o homem desapareceu; e Zaratustra prosseguiu seu caminho através das escuras ruelas.
À porta da cidade, encontrou-se com os coveiros que, aproximando-lhe do rosto seus archotes, reconheceram Zaratustra e se puseram a fazer pesados gracejos a seu respeito: “Lá vai Zaratustra arrastando a cão morto; ainda bem que Zaratustra se fez coveiro! Porque nossas mãos são limpas demais para essa carniça! Zaratustra quer disputar ao diabo a porção que lhe cabe? Pois que faça bom proveito, se regale no festim” Isso, se o diabo não for melhor ladrão que Zaratustra, pois, do contrário, acaba então por devorar os dois!” E, falando uns para os outros, escarneciam entre si.
Zaratustra não disse palavra e seguiu seu caminho. Depois de caminhar por duas horas ao longo de pântanos e bosques, ouvindo o uivo esfaimado dos lobos, a fome o assaltou, por sua vez. Foi então que se deteve diante de uma casa solitária, onde brilhava um lume.
“A fome me assalta como um bandido”, disse Zaratustra. “Minha fome assalta-me no meio dos bosques e dos pântanos e no seio da noite profunda.
Minha fome tem caprichos estranhos. Não raro ela só me vem depois das refeições, e hoje, durante o dia inteiro, não me apareceu: onde teria andado?”
E enquanto assim falava, Zaratustra bateu à porta da casa. Apareceu um ancião, trazendo um lume, que lhe perguntou: “quem chama por mim e pelo meu mau sono?”
“Um vivo e um morto”, respondeu-lhe Zaratustra; “dá-me de comer e beber, pois disso não cuidei durante o dia. Quem nutre o faminto, conforta sua alma: eis a voz da sabedoria.”
O velho retirou-se para logo voltar, oferecendo a Zaratustra pão e vinho. “estas são más paragens para os famintos”, disse ele, “por isso moro aqui. Bichos e homens procuram por mim, o eremita. Mas convida teu companheiro também a beber e comer, ele está mais cansado do que tu.” Zaratustra respondeu: “Meu companheiro é um morto, vai ser difícil convencê-lo disso.”
“Tanto se me dá”, disse o velho, resmungando, “quem bate à minha porta deve aceitar o que ofereço. Comei e passai bem!”
Depois disso, Zaratustra caminhou outras duas horas, guiando-se pelo curso e a luz das estrelas: pois estava habituado a caminhar à noite e gostava de olhar a face de tudo quanto dorme. Mas quando despontou a aurora, Zaratustra se encontrou numa floresta sombria, onde nenhuma passagem parecia haver. Então, vendo uma arvore que tinha um oco à altura de um homem, ali depositou o cadáver – pois queria mantê-lo a salvo dos lobos – estendendo-se no musgo do chão. E logo adormeceu, o corpo fatigado, mas a alma tranqüila.

Comentários:
Nietzsche descreve no que se transformou as quatro virtudes cardinais, segundo a moral humana, são elas;
 Coragem
 Sabedoria
 Temperança
 Justiça
Podemos encontrar as quatro virtudes desenhadas no texto acima e sua crítica apontada pelo autor.
Estamos terminando esta leitura, faltam agora apenas 2 capítulos, onde o autor falará sobre o Eterno Retorno, aguardem.